A 27 de novembro de 2020, foi publicada em Diário da República, a Lei n.º 75/2020, a qual procede à criação e estabelecimento de um processo extraordinário de viabilização de empresas, entrando em vigor a 28 de novembro de 2020.
O Processo Extraordinário de Viabilização de Empresas (doravante PEVE) visa, essencialmente, promover a viabilização de empresas que se encontrem em situações económicas débeis ou em situação de insolvência, iminente ou atual, resultante da pandemia da Covid-19, mas que, ainda assim, sejam suscetíveis de viabilização.
Podem recorrer a este processo empresas que, não tendo pendente qualquer PER ou processo especial de acordo de pagamento à data da de apresentação do requerimento, apresentem as condições necessárias para a sua viabilização e que demonstrem ter um ativo superior a 31 de dezembro de 2019, conforme artigo 3.º, n.º 3 do CIRE.
Caso se trate de uma micro ou pequena empresa que não apresente um ativo superior ao passivo, a mesma poderá usufruir do PEVE se:
- Não tiver pendente um processo de insolvência, processo especial de revitalização ou para acordo de pagamento à data da submissão do requerimento; e
- Tenha sido recebido um auxílio de emergência no âmbito do quadro temporário relativo a medidas de auxílio estatal em apoio da economia, tendo em consideram o panorama atual provocado pela doença Covid-19, e que o mesmo não tenha sido alvo de reembolso nos termos legais; e
- Se encontrar abrangida por um plano de reestruturação, também no quadro de medidas de auxílio estatal.
Também qualquer empresa que a 31 de dezembro de 2019 apresente um passivo superior ao ativo, poderá recorrer a esta situação, caso a sua situação se encontre regularizada nos termos do artigo 35.º do RERE e caso tenha procedido ao depósito tempestivo do acordo de reestruturação.
O PEVE tem início com apresentação, no tribunal competente para declarar a insolvência da empresa em apreço, de um requerimento, o qual deve conter os seguintes elementos:
- Declaração, escrita e assinada, pelo órgão de administração da empresa que ateste que a situação em que se encontra é devida à pandemia da doença COVID -19 e que reúne as condições necessárias para a sua viabilização;
- Cópia dos documentos a que aludem as alíneas b) a i) do n.º 1 do artigo 24.º do CIRE;
- Relação por ordem alfabética de todos os credores, com indicação dos domicílios, dos montantes dos seus créditos, datas de vencimento, natureza e garantias de que beneficiem, e da eventual existência de relações especiais, nos termos do artigo 49.º do CIRE, subscrita e datada, há não mais de 30 dias, pelo órgão de administração da empresa e por contabilista certificado ou por revisor oficial de contas, sempre que a revisão de contas seja legalmente exigida;
- Acordo de viabilização, assinado pela empresa e por credores que representem pelo menos as maiorias de votos previstas no n.º 5 do artigo 17.º -F do CIRE.
Salienta-se a possibilidade de, com a apresentação do requerimento supra, a empresa poder solicitar a apensação do PEVE, intentado por sociedades comerciais com as quais a empresa se encontre numa situação de domínio ou de grupo, sempre que o mesmo se encontre na fase liminar, instaurando no âmbito da presente lei.
Recebido o requerimento acompanhado dos documentos supramencionados, o juiz irá proceder à nomeação do administrador judicial provisório, tendo essa decisão os seguintes efeitos:
- Não é possível proceder à instauração de quaisquer ações para cobrança de dívidas contra a empresa.
- Até ao trânsito em julgado da sentença da homologação ou não homologação, ficam suspensas as ações que se encontrem em curso, tendo em vista a cobrança de dividas, extinguindo-se assim que o acordo de viabilização seja homologado, exceto se o próprio acordo prever a continuação da ação ou caso os créditos desta não se encontrem abrangidos no mesmo.
- A empresa só poderá praticar atos de especial relevo com autorização prévia do administrador judicial provisório, a qual deve ser solicitada, e por posteriormente concedida, por escrito, num prazo de 5 dias, sendo que a falta de resposta do administrador judicial provisório corresponde à recusa do pedido.
- Suspendem-se os processos de insolvência que derem entrada antes e após publicação do acordo de viabilização, bem como todos os prazos de prescrição e caducidade oponíveis pela empresa até à prolação da sentença de homologação ou não homologação. No caso dos processos de insolvência que derem entrada antes da publicação, a sua suspensão só tem lugar caso não tenha sido proferida sentença declaratória de insolvência e extinguem-se como a homologação do acordo de viabilização.
- E até à prolação da sentença, têm de ser assegurados a prestação de serviços públicos tidos como essenciais: fornecimento de água, energia elétrica, gás natural e gases de petróleo liquefeitos canalizados, comunicações eletrónicas, entre outros.
A partir da data da publicação, qualquer credor dispõe de 15 dias para proceder à impugnação da relação de credores, solicitando, assim, a não homologação do acordo de viabilização.
A falta de impugnação converte a relação de credores definitiva.
Nesses 15 dias, o administrador judicial provisório irá proceder à emissão de um parecer sobre se o acordo oferece, ou não, perspetivas razoáveis de garantir a viabilidade da empresa.
Após a apresentação da impugnação e do parecer, cabe ao juiz, no prazo de 10 dias, decidir sobre a impugnação e a analisar o acordo, tendo em consideração as impugnações e o parecer.
A não homologação acarreta, sempre, o encerramento do PEVE e a extinção de todos os seus efeitos.
Mais se refere que qualquer credor que não conste da relação de credores definitiva dispõe de 30 dias, contados a partir da data da publicitação da decisão de homologação, para manifestar a sua intenção de aderir a acordo homologado, sendo a empresa notificada das mesmas para, em 5 dias, informar se aceita. O silêncio da empresa vale como recusa.
No que diz respeito às garantias convencionadas entre a empresa e os seus credores no âmbito do PEVE, mantêm-se mesmo que, findo o processo, venha a ser declarada, no prazo de dois anos, a sua insolvência.
Neste seguimento, mais se acrescenta que gozam de privilégio creditório mobiliário geral os credores, sócios, acionistas ou quaisquer outras pessoas especialmente relacionadas com o devedor que, no âmbito do PEVE, financiem a atividade da empresa disponibilizando capital para a sua viabilização.
Se a empresa vier a ser declarada insolvente são insuscetíveis de resolução em benefício da massa insolvente os negócios jurídicos que hajam compreendido a efetiva disponibilização à empresa de novos créditos pecuniários e a constituição, por esta, de garantias respeitantes a tais créditos pecuniários, desde que os negócios jurídicos hajam sido expressamente previstos no acordo de viabilização.
Tal só não acontecerá se o novo financiamento tiver sido utilizado pela empresa em benefício da respetiva entidade financiadora ou de entidade que com esta esteja especialmente relacionada, nos termos referidos no artigo 49.º do CIRE.
Relativamente aos créditos tributários e da segurança social, é aplicável os regime previsto nos artigos 196.º e 199.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), aprovado pelo Decreto -Lei n.º 433/99, de 26 de outubro, relativamente aos créditos da AT; e artigos 13.º e 14.º do Decreto -Lei n.º 42/2001, de 9 de fevereiro, e n.ºs 13 e 14 do artigo 199.º do CPPT, quanto aos créditos da segurança social, sendo os mesmos indisponíveis e só podendo existir redução da taxa de juros de mora, no âmbito de acordo homologado conducente à consolidação financeira da empresa, nos termos permitidos pela lei em apreço. Essa redução ficará sem efeito em caso de incumprimento do acordo.
A homologação do acordo de viabilização confere às partes subscritoras os benefícios relativos a IRS, IRC, IS e IMT previstos nos artigos 268.º a 270.º do CIRE, desde que compreenda a reestruturação de créditos correspondentes a, pelo menos, 30 % do total do passivo não subordinado da empresa.
O referido acordo é acompanhado da declaração emitida por revisor oficial de contas, certificando que o acordo de viabilização compreende a reestruturação de créditos correspondentes a, pelo menos, 30 % do total do passivo não subordinado do devedor e que, em virtude do acordo de viabilização, a situação financeira da empresa fica mais equilibrada e os capitais próprios da empresa são superiores ao capital social.
Em todos os processos de insolvência pendentes à data da entrada em vigor da presente lei é obrigatória a realização de rateios parciais das quantias depositadas à ordem da massa insolvente, desde que, cumulativamente:
- tenha transitado em julgado a sentença declaratória da insolvência e o processo tenha prosseguido para liquidação do ativo pela forma prevista nos artigos 156.º e seguintes do CIRE;
- esteja esgotado o prazo de impugnação da relação de credores previsto no artigo 130.º do CIRE sem que nenhuma impugnação tenha sido deduzida, ou, tendo-o sido, se a impugnação em causa já estiver decidida, seja nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 131.º do CIRE seja por decisão judicial, aplicando -se o disposto no n.º 1 do artigo 180.º do CIRE caso a decisão não seja definitiva;
- as quantias depositadas à ordem da massa insolvente sejam iguais ou superiores a 10 000 € e a respetiva titularidade não seja controvertida.
O administrador da insolvência elabora o mapa de rateio, tendo comissão de credores, caso tenha sido nomeada, e os credores, 15 dias, a contar da data da publicação, para se pronunciarem sobre o mesmo. Não havendo oposição dos credores nem qualquer manifestação do juiz, o mapa de rateio torna-se definitivo e o administrador da insolvência procede ao pagamento aos credores.
O PEVE apresenta um caráter urgente, encontrando-se isento de custas processuais.
Além do PEVE, a presente lei permite ainda a prorrogação do prazo para conclusão das negociações com vista à aprovação de plano de recuperação ou de acordo de pagamento adaptados ao contexto da pandemia da doença COVID -19, sendo imprescindível a apresentação de um requerimento fundamentado da empresa ou do devedor, consoante os casos, e do administrador judicial provisório.
Prevê-se ainda a aplicação do Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE), aprovado pela Lei n.º 8/2018, de 2 de março, a empresas que se encontrem em situação de insolvência atual em virtude da pandemia da doença COVID -19, caso em que também deverá deve ser apresentado um requerimento fundamentado, na assembleia de credores para apreciação e votação de plano de insolvência (artigo 209.º, n.º1 do CIRE), concedendo o juiz um prazo máximo de 15 dias úteis para adaptação da proposta ao contexto da pandemia da doença COVID -19.
Podem também submeter-se ao RERE:
- A empresa devedora que, comprovadamente, se encontre em situação de insolvência em virtude da pandemia da doença COVID -19 mas que ainda seja suscetível de viabilização e que, de acordo com as normas contabilísticas aplicáveis conjugadas com o previsto no n.º 3 do artigo 3.º do CIRE, demonstre ter, a31 de dezembro de 2019, um ativo superior ao passivo pode submeter ao RERE as negociações e os acordos de reestruturação que alcance com um ou mais dos seus credores;
- As empresas que, não tendo a 31 de dezembro de 2019 o ativo superior ao passivo, tenham logrado regularizar a sua situação com recurso à disposição transitória prevista no n.º 1 do artigo 35.º do Regime do RERE e desde que tenham procedido ao depósito tempestivo do acordo de reestruturação.
Cumpre ainda referir a possibilidade de o privilégio previsto no n.º 2 do artigo 17.º-H do CIRE sere aplicado também aos sócios, acionistas ou quaisquer outras pessoas especialmente relacionadas da empresa que financiem a sua atividade durante o Processo Especial de Revitalização (PER).
Por fim, de salientar o caráter prioritário dos requerimentos de liberação de cauções ou garantias prestadas no âmbito de processo de insolvência, processo especial de revitalização e processo especial para acordo de pagamento, apresentados em processos novos e que encontrem pendentes à data da entrada em vigor da presente lei.
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