Foi aprovado em Conselho de Ministros o Decreto-Lei n.º 81-C/2017, de 7 de Julho, que estabelece o regime jurídico que define os requisitos de acesso e de exercício da atividade de intermediário de crédito e da prestação de serviços de consultoria.
O presente Decreto-Lei vem ainda transpor parcialmente para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2014/17/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos de crédito aos consumidores para imóveis de habitação e procede à alteração ao Decreto-Lei n.º 156/2005, de 15 de setembro, integrando os intermediários de crédito no elenco de entidades que estão sujeitas à obrigatoriedade de existência e disponibilização do livro de reclamações.
Este diploma mostrava-se premente na medida em que, em Portugal, a atividade desenvolvida pelos intermediários de crédito não era objeto de regulação, nem estava sujeita a um quadro normativo específico, ao contrário do que já sucedida noutros Estados-Membros da União Europeia.
Destacaremos, de seguida, os aspetos mais relevantes do regime jurídico em questão.
Âmbito de aplicação
O regime jurídico que regula o acesso e o exercício da atividade de intermediário de crédito e da prestação de serviços de consultoria, aprovado pelo presente Decreto-Lei, apenas se aplica às pessoas singulares e coletivas que atuam como intermediários de crédito e que prestam serviços de consultoria relativamente a contratos de crédito celebrados com consumidores em Portugal.
O presente regime jurídico não é aplicável: à prestação de serviços de intermediação de crédito ou de serviços de consultoria de forma ocasional; à prestação de serviços de consultoria sem propósito comercial, no contexto de serviços públicos ou voluntários de consultoria de gestão de dívida; à prestação de serviços de intermediação de crédito ou de consultoria relativamente aos contratos de crédito para a realização de operações sobre instrumentos financeiros em que intervém a entidade concedente de crédito.
Definição e âmbito da atividade do intermediário de crédito
Para efeitos do regime jurídico em análise entende-se por “intermediário de crédito” a pessoa, singular ou coletiva, que não atua na qualidade de mutuante e não se limita a apresentar, direta ou indiretamente, um consumidor a um mutuante ou a um intermediário de crédito, e que no exercício da sua atividade profissional, presta, contra remuneração de natureza pecuniária ou outra forma de contrapartida económica acordada, um ou vários dos seguintes serviços de intermediação de crédito:
- Apresentação ou proposta de contratos de crédito a consumidores;
- Assistência a consumidores, mediante a realização de atos preparatórios ou de outros trabalhos de gestão pré-contratual relativamente a contratos de crédito que não tenham sido por si apresentados ou propostos;
- Celebração de contratos de crédito com consumidores em nome dos mutuantes.
Salvo disposição legal expressa em contrário, os intermediários de crédito podem cumular a prestação dos serviços de intermediação de crédito com o exercício de outras atividades, incluindo a prestação de serviços de consultoria. Entende-se por “serviços de consultoria” a emissão de recomendações dirigidas especificamente a um consumidor sobre uma ou mais operações relativas a contratos de crédito, enquanto atividade separada da concessão de crédito e da atividade de intermediário de crédito.
Entidades habilitadas a exercer a atividade de intermediário de crédito
A atividade de intermediário de crédito só pode ser desenvolvida pelas seguintes entidades:
- As pessoas singulares e coletivas com domicílio profissional ou com sede social e administração central em Portugal que obtenham autorização para atuar como intermediário de crédito e estejam registadas para o efeito junto do Banco de Portugal;
- As pessoas singulares e coletivas com domicílio profissional ou com sede social ou administração central noutro Estado-Membro da UE que estejam autorizadas a atuar no respetivo Estado-Membro de origem como intermediários de crédito relativamente a contratos de crédito à habitação e que estejam registadas para o efeito junto de autoridade competente desse Estado-Membro, mediante a prestação dos serviços que estejam autorizadas a desenvolver no respetivo Estado-Membro de origem;
- As instituições de crédito, sociedades financeiras, instituições de pagamento e instituições de moeda eletrónica legalmente habilitadas a desenvolver a sua atividade em Portugal, relativamente a contratos de crédito em que não atuem como mutuantes.
Categorias de intermediários de crédito
Os intermediários de crédito podem exercer a sua atividade na categoria de Intermediário de crédito vinculado, Intermediário de crédito a título acessório ou Intermediário de crédito não vinculado.
“Intermediário de crédito vinculado” é pessoa singular ou coletiva que desenvolve a atividade de intermediário de crédito no âmbito de contrato de vinculação, atuando em nome e sob a responsabilidade total e incondicional do mutuante ou do grupo de mutuantes com quem tenha celebrado contrato de vinculação;
“Intermediário de crédito a título acessório» é o fornecedor de bens ou serviços, que em nome e sob responsabilidade total e incondicional do mutuante ou do grupo de mutuantes com quem tenha celebrado contrato de vinculação, atua como intermediário de crédito tendo em vista a venda dos bens ou a prestação dos serviços por si oferecidos;
“Intermediário de crédito não vinculado” é a pessoa coletiva que atua como intermediário de crédito sem que tenha celebrado contrato de vinculação com um mutuante ou um grupo de mutuantes.
As disposições do regime jurídico relativas aos intermediários de crédito vinculados são igualmente aplicáveis aos intermediários de crédito a título acessório.
Entidades habilitadas a prestar serviços de consultoria
A prestação de serviços de consultoria relativamente a contratos de crédito só pode ser desenvolvida pelas seguintes entidades:
- Pessoas singulares e coletivas com domicílio profissional ou com sede social e administração central em Portugal autorizadas a desenvolver a atividade de intermediário de crédito e registadas para o efeito junto do Banco de Portugal, e que estejam igualmente autorizadas a prestar serviços de consultoria;
- Pessoas singulares e coletivas com domicílio profissional ou com sede social ou administração central noutro Estado-Membro da UE que estejam autorizadas a atuar no Estado-Membro de origem como intermediários de crédito relativamente a contratos de crédito à habitação e devidamente registadas para o efeito junto de autoridade competente desse Estado-Membro, e que estejam igualmente autorizadas por autoridade competente do respetivo Estado-Membro de origem a prestar serviços de consultoria relativamente a contratos de crédito à habitação;
- As instituições de crédito, sociedades financeiras, instituições de pagamento e instituições de moeda eletrónica legalmente habilitadas a desenvolver a sua atividade em Portugal.
Requisitos gerais de acesso à atividade de intermediário de crédito
Ao abrigo do regime jurídico em questão, as pessoas singulares e coletivas que pretendam exercer a atividade de intermediário de crédito ou prestar serviços de consultoria em território nacional devem obter autorização junto do Banco de Portugal.
Para obter autorização junto do Banco de Portugal é necessário estarem preenchidos certos requisitos, entre os quais, e caso o interessado seja pessoa singular: ter reconhecida idoneidade; possuir o nível adequado de conhecimentos e competências em matéria de contratos de crédito; possuir organização comercial e administrativa adequada ao exercício da atividade e a subscrição de um contrato de seguro de responsabilidade civil profissional ou a titularidade de qualquer outra garantia equivalente.
Caso o interessado seja pessoa coletiva, constituída ou a constituir, a concessão de autorização depende do preenchimento dos seguintes requisitos: adotar a forma de sociedade por quotas ou sociedade anónima; ter sede social e administração central em território nacional; possuir organização comercial e administrativa adequada ao exercício da atividade; ter designado como membros do órgão de administração pessoas singulares que cumpram os requisitos acima mencionados e que não se encontrem numa das situações de incompatibilidades para o exercício da profissão; subscrição de um contrato de seguro de responsabilidade civil profissional ou a titularidade de qualquer outra garantia equivalente.
De destacar neste regime jurídico o facto de, nas situações em que o interessado (pessoa singular ou membro do órgão de administração) não pretenda exercer a atividade de intermediário de crédito, nem prestar serviços de consultoria relativamente a contratos de crédito à habitação, o requisito do adequado nível de conhecimentos e competências em matéria de contratos de crédito se considerar cumprido com a designação de, pelo menos, um responsável técnico pela atividade do intermediário de crédito, o qual tem de preencher todos os requisitos já indicados.
O “responsável técnico pela atividade do intermediário de crédito” consiste na pessoa singular que, ao abrigo de contrato de trabalho ou de prestação de serviços, coordena e supervisiona a prestação dos serviços de intermediação, sem prejuízos de outras funções que lhe sejam contratualmente atribuídas.
Registo
O Banco de Portugal é responsável pela criação, manutenção e atualização permanente do registo das pessoas singulares e coletivas habilitadas a desenvolver a atividade de intermediário de crédito ou a prestar serviços de consultoria, do registo dos membros dos órgãos de administração dos intermediários de crédito que assumam a natureza de pessoas coletivas e do registo das pessoas singulares que desempenhem a função de responsável técnico pela atividade do intermediário de crédito.
Os intermediários de crédito não podem iniciar a sua atividade enquanto não se encontrarem inscritos no registo.
O Banco de Portugal disponibiliza ao público, através do respetivo sítio na Internet, informação permanentemente atualizada sobre as entidades que estejam habilitadas a atuar como intermediários de crédito, bem como uma lista das instituições de crédito, sociedades financeiras, instituições de pagamento e instituições de moeda eletrónica habilitadas a desenvolver a sua atividade em Portugal que prestem serviços de intermediação de crédito ou de consultoria relativamente a contratos de crédito em que não atuem como mutuantes.
Exercício da atividade de intermediário de crédito
O presente Decreto-Lei regula ainda o exercício da atividade de intermediação de crédito e de serviços de consultoria.
Nas relações com os consumidores, destaca-se o dever do intermediário de crédito de informação qualificada sobre o exercício da sua atividade.
Nas relações com os mutuantes, destaca-se o aspeto da remuneração e o modo de exercício da atividade (vinculação/independência). Os intermediários de crédito vinculados apenas são remunerados pelos mutuantes, não podendo receber quaisquer valores dos consumidores, designadamente a título de retribuição, comissão ou despesa.
A relação entre os intermediários de crédito vinculados e os mutuantes ou grupo de mutuantes deve ser regulada por contrato de vinculação, celebrado em suporte de papel ou noutro suporte duradouro.
Os intermediários de crédito não vinculados são remunerados pelos consumidores, não podendo receber qualquer remuneração pecuniária ou outra contrapartida económica dos mutuantes pelos serviços prestados.
Os intermediários de crédito não vinculados exercem a sua atividade de forma independente face aos mutuantes, devendo apresentar ao consumidor, com imparcialidade e isenção, um número de produtos de crédito representativo do mercado ou do tipo de produto em concreto.
A prestação dos serviços de intermediação de crédito por parte dos intermediários de crédito não vinculados deve ser precedida da celebração de contrato de intermediação de crédito com o consumidor.
Regime sancionatório
O presente Decreto-Lei cria um regime sancionatório quanto às contraordenações relativas à atividade de intermediário de crédito e à prestação de serviços de consultoria e às contraordenações relativas à atividade dos mutuantes. Prevê-se que a tentativa e a negligência são sempre puníveis.
Regime transitório
O Decreto-Lei em análise prevê algumas normas transitórias que permitem às pessoas que já exerciam estas atividades adaptarem-se e cumprirem com os requisitos ora exigidos para o exercício das mesmas. Assim sendo, as pessoas singulares e coletivas que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei (1 de janeiro de 2018), desenvolvam a atividade de intermediário de crédito, podem continuar a exercer essa atividade em Portugal sem a autorização do Banco de Portugal até 12 meses após a data da entrada em vigor do diploma.
Durante o período transitório, as pessoas que desenvolvam a atividade de intermediário de crédito devem observar os deveres de conduta, de informação e de assistência previstos nas normas legais e regulamentares aplicáveis aos contratos de crédito em cuja comercialização intervenham.
Findo este período, as pessoas singulares e coletivas que não tenham obtido autorização e registo para o exercício da atividade de intermediário de crédito ficam proibidas de exercer a referida atividade.
As pessoas coletivas constituídas sob a forma de sociedade anónima que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, desenvolvam a atividade de intermediário de crédito, devem assegurar a conversão de ações representativas do capital social ao portador em nominativas.
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