2017-07-17
Mais um passo no combate à ocultação de verdadeiros contratos de trabalho

 

por: Alexandra Bessone Cardoso & Ana Rodrigues Bidarra

Foi hoje publicada a Lei n.º 55/2017, de 17 de Julho, que aprofunda o regime jurídico da ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho (“ARECT”) e prevê o alargamento dos mecanismos processuais de combate à ocultação de relações de trabalho subordinado (os falsos “recibos verdes” e todas as formas de trabalho não declarado, incluindo falsos estágios e falso voluntariado).

 

Este diploma, que entrará em vigor em 1 de Agosto de 2017, procede à segunda alteração à Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro (Regime Processual aplicável às Contraordenações Laborais e de Segurança Social – “RPACLSS”) e à quinta alteração ao Código de Processo de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99 de 9 de Novembro.

 

No que concerne às alterações introduzidas no RPACLSS, é de notar que, ao abrigo da nova redação do n.º 3 do artigo 15.º-A, a Autoridade para as Condições do Trabalho (“ACT”) terá agora de remeter os factos, bem como todos os elementos de prova recolhidos no âmbito da ação inspetiva, para os serviços do Ministério Público (“MP”) junto do tribunal do lugar da prestação da atividade. Recordamos que, na redação anterior, a participação dos factos seria remetida para os serviços do Ministério Público da área de residência do trabalhador.

 

Assinalamos que as demais alterações a este diploma operam, essencialmente, ao nível da grafia, não se registando alterações substanciais ou procedimentais de relevo. Assim, a ACT mantém a competência para instaurar o procedimento a adotar em caso de inadequação do vínculo que titula a prestação de uma atividade em condições correspondentes às do contrato de trabalho sempre que se verifique, na relação entre a pessoa que presta uma atividade e outra ou outras que dela beneficiam, a existência de características de contrato de trabalho.

Já as alterações ao Código de Processo do Trabalho (“CPT”), designadamente no que à ARECT diz respeito, são profundas.

 

Ora, vejamos:

 

Ao artigo 5.º-A do CPT foi aditada a alínea c), que consagra, agora inequivocamente, a legitimidade ativa do MP na ARECT bem como no procedimento cautelar de suspensão de despedimento regulado no artigo 186.º - S, aditado pela Lei n.º 55/2017, de 17 de Julho.

 

O novíssimo procedimento cautelar de suspensão de despedimento, subsequente a auto de inspeção previsto no artigo 15.º-A do RPACLSS, deverá ser intentado pelo MP sempre que o trabalhador seja despedido entre o momento da notificação do empregador do auto lavrado por inspetor da ACT, que presume a existência de contrato de trabalho, e o trânsito em julgado da decisão judicial da ARECT.

 

O MP interpõe oficiosamente o procedimento cautelar sempre que:

  • Tenha conhecimento, por qualquer meio, da existência de despedimento em caso de existência de características de contrato de trabalho na relação entre a pessoa que presta uma atividade e outra ou outras que dela beneficiam;
  • A pessoa ou pessoas a quem a atividade é prestada aleguem que o contrato que titula a referida atividade cessou, a qualquer título, durante o período do momento da notificação do empregador do auto de inspeção e o trânsito em julgado da decisão judicial da ARECT.

 

Se o despedimento tiver lugar antes da receção da participação dos factos aos serviços competentes do MP, este requer à ACT, até dois dias após o conhecimento da existência do despedimento, a remessa da referida participação, acompanhada de todos os elementos de prova recolhidos, no prazo de cinco dias.

 

Merece especial relevo a supressão da fase conciliatória - audiência de partes –, que se realizava em momento imediatamente anterior ao julgamento.

 

Com efeito, a atual redação do artigo 186.º-O do CPT omite qualquer referência a uma tentativa de conciliação entre empregador e trabalhador, uma vez que o n.º 1 deste artigo prevê que o julgamento se inicia imediatamente, com a produção das provas que ao caso couberem.

 

Também o n.º 9 do artigo 186.º-O foi alterado, com a indicação do propósito da comunicação oficiosa da decisão judicial à ACT e ao Instituto da Segurança Social, I.P. – i.e., a regularização das contribuições desde a data de início da relação laboral fixada na sentença.

 

Importa, em jeito de conclusão, realçar que, por via da eliminação da audiência de partes, é retirada a faculdade de, mediante uma solução amigável e equitativa, os putativos empregador e trabalhador se conciliarem e contribuírem para o resultado final da ação, consagrando-se expressamente a natureza indisponível dos interesses em causa.

 

A disponibilidade/indisponibilidade dos interesses e direitos em causa nesta ação especial é uma questão controversa e amplamente discutida na doutrina e jurisprudência, tendo sido, inclusivamente, analisada pelo Acórdão n.º 85/2016 do Tribunal Constitucional, que se pronunciou pela não inconstitucionalidade da anterior norma do n.º 1 do artigo 186.º-O do CPT quando interpretada no sentido de, na ARECT, não ser permitido aos putativos trabalhador e empregador dispor do objeto do litígio, acordando, em sede de audiência de partes, que a relação jurídica vigente entre ambos é de prestação de serviços.

 

 

 

 

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