Na publicação do passado dia 6 de março, demos a conhecer ao nosso leitor, em traços gerais, o regime das diretivas antecipadas de vontade (DAV) em matéria de cuidados de saúde (Lei n.º 25/2012, de 16 de julho).
No seguimento do aí abordado, cabe-nos agora e por referência à vastíssima jurisprudência a esse mesmo propósito, disponibilizar a quem nos lê, mais esclarecimentos quanto à sua aplicação e ao reconhecimento do direito à autodeterminação em cuidados de saúde, para o que nos debruçaremos sobre o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto com o n.º 1470/16.0T8PVZ-A.P1, de 14/03/2017, e em que é Relator o Exmo. Sr. Dr. Juiz Desembargador Viera e Cunha (disponível em www.dgsi.pt).
No caso em concreto, discute-se perante a incapacidade total e irreversível de um individuo adulto que, não tendo formalizado diretiva antecipada de vontade, deu a saber, em momento em que se encontrava capaz de expressar a sua vontade pessoal e autonomamente, que numa eventual situação de incapacidade futura, não queria qualquer atuação invasiva, nomeadamente alimentar e medicamentosa para lhe prolongar artificialmente a vida.
Como forma de contornar a inexistência de DAV, veio a correr junto do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, pedido de interdição provisória daquele sujeito, visando-se acautelar a sua vontade quanto a futuro em que se encontrasse em estado comatoso e terminal, desta feita por via do representante legal (o tutor) que viesse a ser nomeado.
Entendendo-se as medidas de suporte básico de vida, hidratação e alimentação como subtraídas à vontade do doente, desde que não hajam sido objeto de diretiva antecipada, veio o tribunal de recurso determinar que, no caso em concreto, era inadmissível o suprimento da inexistência da DAV pela decisão do tutor, concluindo, tal como o Tribunal Judicial da Comarca do Porto, pelo indeferimento do pedido de decretamento da interdição provisória.
Para a decisão pesou que, não tendo o sujeito no pleno exercício das suas capacidades e faculdades mentais feito constar nos termos exatos de DAV que não consentia ou recusava tratamento médico, pese embora o tivesse formalizado verbalmente perante familiares e amigos, o tutor, no papel de cuidador que lhe caberia com a interdição decretada, não se possa substituir à exigência expressa da diretiva antecipada de vontade.
No caso, e na evolução do estado de saúde do sujeito, à família caberá apenas participar nas decisões a tomar sobre os cuidados a aplicar, fazendo-se ouvir e emitir opinião relevante a esse propósito que os médicos terão em consideração, mas à qual não ficam vinculados, de acordo com o Código Deontológico da Ordem dos Médicos Portuguesa.
Em suma, ou o sujeito que pretende acautelar, de futuro, os cuidados de saúde que quer que lhe sejam prestados, o faz por via de uma DAV ou, encontrando-se incapaz de expressar a sua vontade pessoal e autonomamente por essa ocasião ninguém o poderá substituir-se nesses propósitos.
Aviso Legal: A presente Informação destina-se a ser distribuída entre Clientes e Colegas e a informação nela contida é prestada de forma geral e abstrata, não devendo servir de base para qualquer tomada de decisão sem assistência profissional qualificada e dirigida ao caso concreto. O conteúdo desta Informação não pode ser reproduzido, no seu todo ou em parte, sem a expressa autorização do editor. Caso deseje obter esclarecimentos adicionais sobre este assunto contacte-nos através do endereço de e-mail: abclegal@abclegal.com.pt