2020-04-14
COVID-19: Lei n.º 9/2020 - Regime excecional de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça

 

por: Ana Rita Calçada & Joana Ferreira Figueiredo

No passado dia 10 de abril, foi publicada em Diário da República, a Lei nº 9/2020 que estabelece o regime excecional de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça, no âmbito da pandemia da doença COVID-19, tendo entrado em vigor no dia seguinte à sua publicação. 

 

Este diploma visa estabelecer, no âmbito da emergência de saúde pública vivida por ocasião da doença COVID-19, as seguintes medidas:

 

(1) perdão parcial de penas de prisão,

 

(2) regime especial de indulto das penas,

 

(3) regime extraordinário de licença de saída administrativa de reclusos condenados e

 

(4) antecipação extraordinária da colocação em liberdade condicional.

 

Porém, estas medidas não se aplicam a condenados por crimes cometidos contra membro das forças policiais e de segurança, das forças armadas e funcionários e guardas dos serviços prisionais, no exercício das respetivas funções.

 

 

(1) Perdão parcial de penas de prisão

O perdão parcial de penas de prisão é aplicável às penas de prisão de reclusos condenados por decisão transitada em julgado, de duração igual ou inferior a dois anos, e ao remanescente das penas (cumulativas ou somatório de sucessivas) caso o tempo para cumprimento integral seja igual ou inferior a dois anos e já tenha sido cumprido metade.

 

No caso de condenações em penas de substituição, este perdão parcial só deve ser aplicado se houver lugar à revogação ou suspensão.

 

Importa referir que este perdão é concedido apenas uma vez a cada recluso e aos que as suas condenações tenham transitado em julgado em data anterior à da entrada em vigor da presente lei e sob a condição resolutiva de o beneficiário não praticar infração dolosa no ano subsequente, caso em que à pena aplicada à infração superveniente acresce a pena perdoada.

 

Excluem-se deste benefício, conforme refere o artigo 6º n.º2 do presente diploma, os condenados pela prática de crime de homicídio; do crime de violência doméstica e de maus tratos; de crimes contra a liberdade pessoal; de crimes contra a liberdade sexual e autodeterminação sexual; dos crimes de roubo com perigo para a vida ou ofensas à integridade física ou resultar morte da vítima; de crimes contra a identidade cultural e integridade pessoal; dos crimes de incêndios, explosões e outras condutas especialmente perigosas, energia nuclear e incêndio florestal quando tenham sido cometidos com dolo; do crime de associação criminosa; do crime de branqueamento; dos crimes de recebimento indevido de vantagem, de corrupção passiva e ativa; dos crimes de tráfico e outras atividades ilícitas,  de precursores e de associações criminosas; de crime enquanto membro das forças policiais e de segurança, das forças armadas ou funcionários e guardas dos serviços prisionais, no exercício das suas funções, envolvendo violação de direitos, liberdades e garantias pessoais dos cidadãos, independentemente da pena; de crime enquanto titular de cargo político ou de alto cargo público, magistrado judicial ou do Ministério Público, no exercício de funções ou por causa delas; dos crimes de ofensa à integridade física grave, qualificada e agravada pelo resultado.

 

 

(2) Indulto excecional

Por sua vez, pode ser proposto ao Presidente da República por membro do Governo responsável pela área da justiça o indulto total ou parcialmente, da pena de prisão aplicada a recluso que tenha 65 ou mais anos de idade à data da entrada em vigor da presente lei e seja portador de doença, física ou psíquica, ou de um grau de autonomia incompatível com a normal permanência em meio prisional. 

 

O procedimento é iniciado pelo diretor do estabelecimento prisional a que esteja afeto o recluso condenado, com o consentimento deste, que remete, em 48 horas, ao diretor-geral de Reinserção e Serviços Prisionais, proposta de indulto excecional acompanhada dos seguintes elementos: informação médica sobre o estado de saúde, física ou psíquica, do recluso e o seu grau de autonomia e a sua incompatibilidade com a normal manutenção em meio prisional; informações constantes do processo individual do recluso; registo criminal atualizado do condenado; cômputo da pena, homologado pela autoridade judiciária competente. Após obtido parecer do diretor-geral de Reinserção e Serviços Prisionais, a proposta é remetida, em 48 horas, ao Ministério da Justiça, que a leva à decisão do Presidente da República.

 

O prazo inicial para os pedidos de indulto serem apresentados pelos interessados é de três dias úteis contados da entrada em vigor da presente lei, devendo ser subsequentemente instruídos em cinco dias úteis.

 

Excluem-se deste benefício de indulto, os reclusos condenados pela prática dos crimes evidênciados no artigo 6º do artigo 2 da presente Lei.

 

 

(3) Licença de saída administrativa extraordinária

A licença de saída administrativa extraordinária pode ser concedida ao recluso pelo período de 45 dias, com possibilidade de renovação, desde que cumulativamente se verifiquem os seguintes requisitos: o preenchimento dos pressupostos e critérios gerais de concessão da licença de saída previstos no artigo 78.º do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade; o gozo prévio de pelo menos uma licença de saída jurisdicional ao recluso que cumpre pena em regime aberto ou o gozo prévio de duas saídas jurisdicionais ao recluso que cumpre pena em regime comum; a inexistência de qualquer situação de evasão, ausência ilegítima ou revogação da liberdade condicional nos 12 meses antecedentes.

 

Quando seja concedido ao recluso tal licença, recai sobre o condenado os deveres de permanecer na sua habitação e de aceitar a vigilância dos serviços de reinserção social e dos elementos dos órgãos de polícia criminal territorialmente competentes, cumprindo as suas orientações e respondendo aos contactos periódicos que com ele vierem a estabelecer, nomeadamente por via telefónica.

 

Durante a vigência da licença de saída, o diretor-geral de Reinserção e Serviços Prisionais pode autorizar o recluso que cumpre pena em regime aberto a manter a atividade laboral que desenvolvia fora do estabelecimento prisional ou autorizar a deslocação a estabelecimento de saúde para receber cuidados médicos.

 

Se, durante a licença de saída extraordinária, o recluso deixar de cumprir injustificadamente qualquer das condições impostas, ser-lhe-á aplicada uma solene advertência ou revogada a licença.

 

De salientar que o período de saída é considerado tempo de execução da pena ou da medida privativa da liberdade, exceto se a licença for revogada.

 

 

(4) Adaptação à liberdade condicional

 Quanto à adaptação à liberdade condicional, verificando-se o gozo, com êxito, de licença de saída administrativa, a colocação em liberdade condicional pode ser antecipada pelo tribunal de execução das penas, por um período máximo de seis meses. A liberdade condicional será equivalente ao período que o recluso condenado tem de cumprir para atingir dois terços ou cinco sextos da pena, conforme se trate de pena de prisão em medida inferior ou superior a seis anos.

 

Durante o período da antecipação, para além do cumprimento das demais condições impostas, o condenado fica obrigado ao regime de permanência na habitação, aceitando a vigilância dos serviços de reinserção social e dos órgãos de polícia criminal territorialmente competentes, cumprindo as suas orientações e respondendo aos contactos periódicos, que com ele vierem a estabelecer, nomeadamente por via telefónica.

 

 

Regresso do condenado ao meio prisional

De notar que, em qualquer das circunstâncias que ditem o regresso do condenado ao meio prisional, é obrigatório o cumprimento prévio de um período de quarentena de 14 dias.

 

 

Prisão preventiva e reclusos especialmente vulneráveis

Já quanto aos casos de prisão preventiva e reclusos especialmente vulneráveis, com 65 ou mais anos de idade à data da entrada em vigor da presente lei e portador de doença, física ou psíquica, ou de um grau de autonomia incompatível com a normal permanência em meio prisional, deve o juiz proceder ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva independentemente do decurso dos três meses referidos no artigo 213.º do Código de Processo Penal, de modo a reponderar a necessidade da medida, avaliando, nomeadamente, a existência de perigo de fuga, perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo, ou continuidade de perigo da atividade criminosa ou perturbação da ordem e tranquilidade públicas.

 

 

Assinala-se ainda que para aplicação do presente diploma são afetos aos tribunais de execução das penas os juízes necessários.

Por fim, o presente diploma cessa a sua vigência no termo da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS -CoV -2 e da doença COVID -19.



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