No dia 26 de fevereiro de 2021, foi publicada no Boletim Oficial do Banco de Portugal n.º 2/2021 – 2.º Suplemento a Instrução n.º 2/2021 do Banco de Portugal, que entra em vigor a 1 de março de 2021 e que densifica e concretiza, no âmbito do combate ao branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo, as medidas simplificadas e reforçadas de identificação e diligência relativamente às relações de negócio, destinadas às entidades obrigadas nos termos e para efeitos da Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto.
Em suma, o presente diploma complementa, para aplicação das entidades financeiras, as listas não exaustiva de fatores e tipos indicativos de risco potencialmente mais reduzido e de risco potencialmente mais elevado constantes do Anexo II e do Anexo III da Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto e do Aviso do Banco de Portugal n.º2/2018, de 26 de setembro, bem como o concreto conteúdo das medidas simplificadas e reforçadas de identificação e diligência.
Na presente instrução identificam-se como fatores e tipos indicativos de risco de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo, que devem ser ponderados pelas entidades financeiras, os seguintes:
A) Potencialmente mais reduzidos:
- Fatores de risco inerentes aos clientes: a) clientes com uma estrutura de controlo e propriedade simples que permita um conhecimento fácil, rápido e suficiente sobre os seus beneficiários efetivos; b) Clientes que cumpram requisitos de divulgação de informação, dando total transparência às informações sobre os beneficiários efetivos, tal como as sociedades com negociação em mercado regulamentar; c) clientes com ativos e investimentos de valor reduzido.
- Fatores de risco inerentes ao produto, serviço, operação ou canal de distribuição: a) produtos financeiros não complexos e de baixa rentabilidade ou retorno; b) produtos de utilização limitada ou finalidade específica: produtos de poupança de prazo fixo com limiares de poupança baixos; produtos cujos benefícios apenas podem ser concretizados a longo prazo ou por um motivo específico, como a reforma ou a aquisição de um imóvel para habitação própria e permanente; produtos disponibilizados a determinadas categorias de clientes que preencham circunstâncias pré-definidas, como os beneficiários de prestações sociais, pais em representação dos seus filhos, ou menores até estes atingirem a maioridade; transferências recorrentes, nomeadamente através de débito direto, de montante idêntico e para o mesmo beneficiário, com aparente racionalidade económica, incluindo pagamento de serviços mínimos essenciais, pagamento de salários e contribuições para fundos de pensões; produtos que não permitem carregamentos ou reembolsos em numerário; produtos que só podem ser utilizados em território nacional; produtos que apenas podem ser utilizados para adquirir bens ou serviços limitados a certos comerciantes ou pontos de venda e a entidade financeira tenha conhecimento suficiente das atividades prosseguidas pelos comerciantes; produtos de crédito de baixo valor condicionado à compra de um bem ou serviço de consumo. c) pooled accounts tituladas por clientes que residam em zonas geográficas de risco mais baixo e que se mostrem em condições de apresentar de imediatos informações e documentos dos seus clientes; d) serviços de iniciação do pagamento; e) serviços de informação sobre contas.
B) Potencialmente mais elevados:
- Fatores de risco inerentes aos clientes: a) clientes que sejam organizações sem fins lucrativos e que tenham sido identificadas como representando um risco acrescido; b) clientes com nacionalidade ou passagem, residentes ou que desenvolvam atividade em jurisdições associadas a um risco mais elevado de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo; c) clientes com ligações conhecidas a foreign terrorist fighters; d) clientes que exerçam atividades económicas com bens de uso dual; e) clientes que exerçam atividades económicas em setores propensos a evasão fiscal ou ao risco elevado de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo (v.g. imobiliário, jogo, transportes, leilões, entre outros); f) clientes que exerçam atividades económicas em setores frequentemente associados a elevados índices de corrupção; g) clientes que utilizem intermediários ou mandatários com amplos poderes de representação, para efeitos de início ou gestão da relação de negócio, principalmente quando os mesmos tenham sede em jurisdições associadas a um risco mais elevado de branqueamento de capitais ou financiamento do terrorismo; h) clientes que sejam pessoas coletivas recém constituídas e sem um perfil de negócio conhecido ou adequado à atividade declarada; i) clientes que sejam veículos de detenção ou gestão de ativos (asset holding vehicles e asset management vehicles); j) clientes que tenham sido sujeitos a medidas ou sanções de natureza administrativa ou judicial por violação do quadro normativo relacionado com o branqueamento de capitais ou o financiamento do terrorismo.
- Fatores de risco inerentes ao produto, serviço, operação ou canal de distribuição: a) produtos ou serviços associados a ativos virtuais; b) produtos, serviços, operações ou canais de distribuição que se caracterizam por um excessivo grau de complexidade ou segmentação; c) operações em numerário e de elevado valor, sobretudo com recurso a notas de elevada denominação; d) operações pontuais de elevado valor, tendo em conta o que é expectável para o caso concreto; e) produtos sem utilização geográfica delimitada, ainda que tal não seja necessário para a execução das respetivas finalidades; f) créditos garantidos por bens que se encontram em jurisdições que dificultam ou impeçam a obtenção de informação relativa à identidade e legitimidade das partes envolvidas (e respetivos beneficiários efetivos) na prestação da garantia; g) circuito de fundos com um número elevado de intermediários que operam em diferentes jurisdições como produtos de moeda eletrónica ou outros instrumentos pré-pagos que permitem a transferência de fundos entre diferentes utilizadores; i) quaisquer operações financiadas com recurso a moeda eletrónica anónima; j) a criação ou o recurso a veículos de detenção ou gestão de ativos (asset holding vehicles e asset management vehicles).
- Fatores de risco inerentes às relações de correspondência: a) relações de correspondência em que o respondente ou o seu grupo financeiro tenha sido objeto de medidas ou sanções relevantes para a prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo; b) situações em que o respondente desenvolve um segmento significativo do seu negócio em atividades ou setores frequentemente associados ao branqueamento de capitais ou ao financiamento do terrorismo; c) relações de correspondência com entidades que detenham uma offshore banking license.
- Fatores de risco inerentes à localização geográfica: a) jurisdições identificadas como apresentando sistemas judiciais ineficazes ou deficiências na investigação de crimes associados ao branqueamento de capitais ou ao financiamento do terrorismo; b) jurisdições que não implementam registos (ou outros mecanismos equivalentes) fiáveis e acessíveis de beneficiários efetivos; c) jurisdições que não implementaram a Norma Comum de Comunicação desenvolvida pela Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico (OCDE), relativa à troca automática de informações (Common Reporting Standard); d) jurisdições conhecidas pela oferta de procedimentos administrativos relevantes simplificados ou inexistentes ou regimes de tributação privilegiada claramente mais favoráveis; e) jurisdições que impeçam ou limitem o cumprimento pela entidade financeira das normas que regem a atividade.
Da ponderação dos fatores e tipos indicativos de risco, pode resultar a aplicação de medidas simplificadas já estabelecidas legalmente, bem como de outras medidas criadas pelas entidades financeiras, desde que adotem mecanismos que permitam verificar a manutenção do nível de risco e a sua análise, devendo estas entidades solicitar informação ou elementos adicionais em todas as relações de negócios ou transações ocasionais, especialmente no caso de alargamento dos serviços ou produtos.
De salientar que as medidas simplificadas têm pressupostos específicos no caso dos serviços de iniciação do pagamento e de informação sobre contas, bem como no caso de utilização de moeda eletrónica.
Por sua vez, aquando da avaliação, ponderação e gestão do risco de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo resulte elevado devem ser aplicadas medidas reforçadas de identificação e diligência já legalmente estabelecidas ou criadas pelas entidades financeiras e que reflitam os diferentes graus de risco da atividade na prática, como:
A) Clientes, representantes e beneficiários efetivos
- Recolha de informação adicional sobre a origem e legitimidade do património; a legitimidade e reputação dos fundos envolvidos na relação de negócio; membros próximos da família e pessoas reconhecidas como estreitamente associadas; as atividades anteriormente desenvolvidas; o número, a dimensão e a frequência das transações que se estimam realizar no âmbito da relação de negócio.
- Recurso a fontes de informação independentes e credíveis.
- Na verificação da origem do património, as entidades financeiras ponderam a utilização dos seguintes meios comprovativos: a) declarações de rendimentos e, quando aplicável, de controlo da riqueza; b) relatórios de demonstrações financeiras ou certificação de contas elaborados por auditores independentes; c) recibos de vencimento; d) certidões extraídas de registos públicos; e) documento comprovativo de aquisição sucessória; f) informação pública, incluído a proveniente de órgãos de comunicação social, desde que de fonte independente e credível.
- Em situações de risco acrescido em que o cliente, representante ou beneficiário efetivo apresentem algum elemento de conexão com outras jurisdições, as entidades financeiras obtêm, pelo menos, informação sobre: a) as relações que os mesmos tenham com essas jurisdições; b) a existência de pessoas associadas que possam influenciar as suas operações; c) nos casos em que tenham sede ou domicílio noutra jurisdição, o motivo pelo qual se pretende estabelecer uma relação de negócio ou realizar uma transação ocasional fora da sua jurisdição de origem.
- Redução do intervalo temporal para a atualização da informação.
B) Contas jumbo
- Garantir a rastreabilidade de qualquer operação.
C) Pooled accounts
- As entidades financeiras tratam como beneficiários efetivos os clientes do cliente titular de uma pooled account, adotando medidas de identificação e de verificação da identidade de acordo com o risco concretamente identificado. Sempre que nesta modalidade, se identifique uma situação de risco elevado, as entidades financeiras ponderam a obtenção de informação adicional, solicitam a autorização de superiores hierárquicos para o estabelecimento da relação de negócio e intensificam os procedimentos e a monitorização da relação de negócio ou de determinadas operações e do seu acompanhamento.
D) Produto, serviço, operação ou canal de distribuição
- Sempre seja identificada uma situação de risco acrescido associado a um produto, serviço, operação ou canal de distribuição, as entidades financeiras adotam: a) limitação do número ou montante de operações permitidas; b) limitação da utilização a determinadas jurisdições; c) limitação da utilização a determinadas tipologias de clientes; d) limitação ou restrição da realização de operações em numerário; e) exigibilidade da realização de operações de depósito, carregamento, resgate ou reembolso através de meio rastreável, nomeadamente através de conta aberta junto de entidade financeira ou outra legalmente habilitada que, não se situando em país terceiro de risco elevado, comprovadamente aplique medidas de identificação e diligência; e) parametrização dos alertas em conformidade com o risco atribuído ao produto, serviço ou operação, definindo e ajuste do mesmo conforme o caso concreto.
- As entidades financeiras adotam medidas reforçadas sempre que novos produtos, serviços ou canais de distribuição apresentem riscos acrescidos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo, incluindo a intervenção da direção de topo na aprovação da respetiva comercialização ou utilização.
E) Private banking
- As entidades financeiras devem sempre procurar obter informação adicional, monitorizá-la, reanalisar o risco pelo menos anualmente, solicitar a intervenção de profissionais com níveis hierárquicos mais elevados, reduzir o intervalo temporal para a atualização da informação e monitorizar o acompanhamento da relação de negócio. Em complemento a estas medidas, podem ser ponderadas situações de se exigir que os depósitos em numerário e outros valores sejam efetuados presencialmente e ao balcão, a análise e acompanhamento em tempo real das operações e a obtenção de informação adicional sobre estruturas de negócio complexas, como fundos fiduciários ou veículos de investimento privado.
F) Trade finance
- As entidades financeiras devem procurar informação adicional sobre os clientes, os seus representantes e os beneficiários efetivos, as operações e as contrapartes, solicitar a intervenção de superiores hierárquicos para concretizar o negócio e estabelecer o risco.
- Para este efeito, sugere-se a recolha de elementos sobre: a) as jurisdições nas quais o cliente exerce atividade; b) a existência de controlos cambiais ou restrições à saída de divisas em jurisdições onde o cliente exerce atividade; c) as rotas comerciais utilizadas, incluindo jurisdições de origem, destino e trânsito dos bens, bem como os navios, portos, companhias áreas e de navegação e entidades carregadoras utilizadas; d) os bens comercializados, em especial sobre bens de uso dual ou dissonantes com a atividade económica declarada; e) compradores, fornecedores, entidades seguradoras, agentes e outros terceiros envolvidos no circuito comercial, bem como a respetiva localização geográfica.
- Os meios comprovativos a utilizar são a informação pública, pareceres externos sobre a racionalidade comercial da fixação de preços dos bens, informações atualizadas e credíveis sobre preços em relação a mercadorias comercializadas e verificação sobre se os pesos e os volumes dos bens a enviar são compatíveis com o método de envio.
G) Localização geográfica de risco elevado
- As entidades financeiras obtêm informação adicional sobre a jurisdição em causa e intensificamos procedimentos de monitorização.
Por último, de salientar que as avaliações, procedimentos e medidas definidos têm de ser reduzidos a escrito e integrados nos documentos já existentes sobre políticas e procedimentos de forma a que demonstrem detalhadamente a respetiva adequação. E também aqui deve resulta a obrigação de cumprimento do dever de conservação para os documentos, registos e análises recolhidos ou elaborados no âmbito do cumprimento da presente Instrução.
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